19 de dez. de 2005
Televisão 2006
Texto publicado na Folha sobre Politica e Estética na TV e as perspectivas para 2006 na área de televisão. Em março de 2006 pretendemos fazer uma ampla discussão na Escola de Comjunicação da UFRJ sobre as mudanças com a TV Digital no campo da Comunicação.
Folha de São Paulo. Mais! São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 2005
Televisão - Canais abertos
IVANA BENTES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Espero que em 2006 fique cada vez mais evidente que a televisão brasileira é uma concessão do Estado e da sociedade brasileira, e não o contrário, o Estado brasileiro e a sociedade reféns da televisão. Sendo concessões públicas, as TVs em 2006, além de usarem a concessão para ganhar dinheiro oucomo máquina político-eleitoral, poderiam quadruplicar sua contrapartida pública, social, cultural, experimental, educativa, para além do mercado, do lucro e da chantagem política.
Como a TV é importante e influente demais para ficar na mão apenas dos executivos, do marketing e dos altos índices de audiência, espero que em 2006 seja aberta a caixa-preta da TV para os conselhos de ética, à produção independente, à produção regional e exibam na TV aberta o cinema, a videoarte e os curtas-metragens brasileiros.
Espero que o Brasil não perca a oportunidade histórica, com a implantação da TV digital, de democratizar o mais poderoso meio de comunicação do país.
Dependendo do que for decidido agora, no início de 2006 será possívelaumentar e disponibilizar novos canais (multicanais) para novos atores,movimentos sociais, ONGs, favelas, para o cinema brasileiro, para os coletivos de arte, as universidades etc. ou manter as emissoras de TV sob ocontrole dos mesmos, de uma minoria.
Democracia interativa
Agora, implantar o sistema de alta definição (HDTV) em 2006 só paratransmitir a Copa do Mundo da Alemanha e faturar milhões em anúncios é um negócio que só as emissoras de TV e o ministro das Comunicações, Hélio Costa, defendem. Nenhuma linha a mais de definição na tela é necessária paraver um jogo de futebol, e interatividade para clicar e comprar produtos natela da TV não tem nada a ver como democracia participativa!
Espero que seja revista a Lei Geral de Comunicação de Massa e que televisão,cinema, vídeo, internet e toda produção audiovisual possam ser finalmente reguladas e regulamentadas por um só órgão, a Ancinav (Agência Nacional deCinema e Audiovisual). Agência que foi abortada por questões políticas,lobby e pressão das emissoras de televisão.
Espero que, em 2006, todo telespectador brasileiro, associação, grupo, rede,organização tenham direito de resposta na TV, podendo ocupar o temponecessário, na TV aberta ou a cabo, sempre que forem lesados em seusdireitos de cidadão.
Estética
Esteticamente, espero que os núcleos de experimentação de novas linguagenscresçam e apareçam, que a interatividade inteligente e os novos formatos,como os "reality shows" e games, não se esgotem na sua versão comercial, quese invista em documentários que produzam conhecimento novo, que investiguema realidade, e não apenas ilustrem o que já sabemos com "faits-divers" e imagens sensacionalistas.
Que os criadores da TV descubram a televisão segundo Jean-Luc Godard, Peter Greenaway, The Kitchen [centro de vídeo, música, performance, dança, filme eliteratura em Nova York], descubram o documentário experimental e uma nova iconografia para expressar o Brasil que não seja só o nacional-popular, o nacionalismo engessado, o neopopulismo, mas as novas imagens e forças,transnacionais, que nos habitam e que a TV ainda não conseguiu mapear.
Que as imagens das favelas nos telejornais não sirvam apenas para produzir o medo, o preconceito, os discursos de repressão e o estado de exceção,imagens e reportagens que legitimam o assassinato diário de favelados pela polícia e que produzem um novo conservadorismo que pede a remoção dasfavelas e a expulsão dos pobres de nosso campo visual.
Em 2006, espero que a televisão não faça campanha eleitoral nos seu programas de entretenimento, nos "talk shows", nos telejornais e que não eleja nem derrube nenhum candidato a presidente da República.
É pedir demais?
Ivana Bentes é professora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro
http://www1.folha.uol.com.br
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